Instituto Sumaúma manifesta apoio à denúncia de ataque às cotas raciais na UFG

Ironicamente no mês da consciência negra, a política de reserva de vagas para pessoas negras no serviço público (Lei nº 12.990/2014) sofreu grave violação no concurso público para o cargo de docente da Faculdade de Informação e Comunicação (FIC) da Universidade Federal de Goiás (UFG).

Vale pontuar que 2022 marca os 10 anos da execução da lei de ações afirmativas de ingresso nas universidades públicas (Lei nº 12.711/2012) e os 20 anos que ativistas, pesquisadoras e pesquisadores negros brasileiros têm pautado o tema institucionalmente, mas ainda assim parece que alguns setores da sociedade ainda não compreenderam a função e a importância desses mecanismos.

Embora com o concurso público já realizado e a candidata negra Gabriela Marques Gonçalves aprovada para a vaga reservada já nomeada, o juiz federal Urbano Leal Berquó Neto suspendeu o ato e determinou o cancelamento da posse. A vaga então foi preenchida pelo candidato branco Rodrigo Gabrioti de Lima – responsável pelo ingresso da ação na Justiça solicitando a suspensão da reserva de vagas.

Segundo o Coletivo de Estudantes Cotistas, desde 2019 a UFG segue uma metodologia de distribuição de vagas que tem por objetivo executar de modo efetivo a lei. A cada cinco vagas, a primeira é reservada aos candidatos que se autodeclararem negros, observando-se a ordem cronológica da entrada dos pedidos de concursos das Unidades Acadêmicas e Unidades Acadêmicas Especiais junto à Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas (Propessoas). A UFG foi pioneira em aplicar esta metodologia que tem sido replicada em instituições de ensino federal em todo país.

Diante desse grave ataque a uma política pública amparada na Lei nº 12.990/2014, que é resultante da luta dos Movimentos Negros no Brasil e que tem como premissa a busca por reparação, de acesso à educação e ao trabalho digno, o Instituto Sumaúma, além do apoio à denúncia organizada pelo Coletivo de Estudantes Cotistas da Pós-graduação da UFG, acrescenta:

  • Solidariedade à colega professora Doutora Gabriela Marques Gonçalves que em pleno 2022 passa por tamanho desrespeito e constrangimento, além de prejuízos pessoais e financeiros;
  • Profundo repúdio a má fé empregada pelo candidato Rodrigo Gabrioti de Lima que desrespeitou um mecanismo legítimo de inserção de pluralidade e diversidade na extremamente embranquecida academia brasileira para se valer de seu privilégio branco, por meio de uma ação racista;
  • Bem como profundo repúdio à decisão judicial que passou por cima da autonomia administrativa da universidade pública, corroborando com as facetas do racismo estrutural no Brasil;
  • Solicitamos também posicionamento institucional das duas maiores e mais importantes associações do campo da pesquisa acadêmica em comunicação do país: a Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom) e a Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação (Compós) que até o momento (27/11) não emitiram sequer uma nota de solidariedade, embora a decisão judicial tenha ocorrido em setembro e a discussão esteja mais presente nos ambientes comunicacionais a pelo menos uma semana;
  • À Intercom, em especial, um posicionamento veemente sobre manter em seu quadro de diretores alguém que vai contra os objetivos previstos em seu próprio estatuto social;
  • Esperamos da branquitude aliada, além de posicionamento teórico-textual, ações concretas que colaborem com o Movimento Negro organizado no debate público sobre este caso. Utilizem os acessos, o poder, os meios e seus privilégios para pautar verdadeiramente e pungentemente mais este grave ataque às conquistas e lutas da população negra.

Abaixo a íntegra da denúncia do Coletivo de Estudantes Cotistas da Pós-graduação da UFG, assine aqui a petição pública.

Denúncia de ataque às cotas na UFG

O Coletivo de Estudantes Cotistas da Pós-graduação da UFG vem a público denunciar o ataque em curso à política de reserva de vagas para pessoas negras no serviço público (Lei nº 12.990/2014).

No último dia 8 de setembro, o juiz federal Urbano Leal Berquó Neto suspendeu o ato que determinou a reserva de vagas para cotas em concurso público para o cargo de docente da Faculdade de Informação e Comunicação (FIC) da UFG. Como o concurso público já havia sido realizado e a candidata negra aprovada para a vaga reservada já havia sido nomeada, o juiz determinou o cancelamento da posse e, também, que a vaga fosse preenchida pelo candidato branco, aprovado em primeiro lugar na ampla concorrência.

Na última quarta-feira, 16 de novembro de 2022, o Diário Oficial da União publicou a nomeação do candidato branco, que agora está livre para tomar posse no cargo e ocupar a vaga que não é dele. Apesar da falta de posicionamento público da UFG sobre o caso, nós estudantes não vamos nos silenciar. RACISTAS NÃO SERÃO BEM-VINDOS NA NOSSA UNIVERSIDADE! Por isso, estamos convocando um ato para a próxima segunda-feira, 21 de novembro, ao meio-dia, em frente ao Restaurante Universitário do Campus Samambaia.

A Lei n° 12.990/2014 reserva, a pessoas negras, 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal direta e indireta, sempre que o número de vagas oferecidas for igual ou superior a 3 (três).

Nos concursos para docentes da carreira de magistério superior, o limite mínimo de três vagas era um entrave à efetividade da Lei. Na UFG, por exemplo, a oferta de vagas costumava ser distribuída por diferentes áreas de conhecimento, quase sempre com apenas uma vaga em cada área. Nesse contexto, os editais de concursos para professores da UFG quase nunca previam as cotas para candidatos negros.

Em novembro de 2018, um grupo de integrantes de Coletivos Acadêmicos e de Núcleos de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFG, vinculados a temáticas relativas à equidade racial, direitos humanos e ações afirmativas, apresentou à Universidade um documento que denunciava a interpretação equivocada da Lei e pediu providências.

Atendendo a essa demanda, a UFG estabeleceu uma nova metodologia para a aplicação da reserva de vagas para docentes negros, baseada na Recomendação nº 10, de 27/05/2009, encaminhada pelo Ministério Público Federal em Goiás (MPF-GO), que entende que o cargo oferecido por meio de concurso de provas e títulos pela UFG é único: Professor do Terceiro Grau, apesar de as vagas serem para diferentes áreas.

A partir de 2019, as cotas nos concursos para docentes na UFG passaram a ser estabelecidas da seguinte forma: a cada cinco vagas, a primeira é reservada aos candidatos que se autodeclararem negros, observando-se a ordem cronológica da entrada dos pedidos de concursos das Unidades Acadêmicas e Unidades Acadêmicas Especiais junto à Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas (Propessoas). A UFG foi pioneira em aplicar a metodologia, que vem sendo adotada, atualmente, em diversas IFES pelo país.

Ignorando completamente os esforços da UFG para garantir o cumprimento da política de inclusão, a justiça federal, através da seção judiciária de Goiás, entendeu que o concurso oferecia apenas uma vaga (para o curso de jornalismo) e suspendeu o ato que determinou a reserva de vagas, acatando o pedido do candidato branco, que se inscreveu no concurso sabendo que a vaga era reservada para candidatos autodeclarados negros, tendo em vista que a informação constava no Edital.

No mês da consciência negra, vimos a público denunciar que esta não é a única ação de ataque à política de cotas no serviço público no Brasil. Um caso como esse ocorreu na Universidade Federal de Sergipe (UFS). As reservas de vagas para pessoas negras são resultado da histórica luta do Movimento Negro por acesso à educação e ao mercado de trabalho. Essa política tem se mostrado como um importante instrumento de combate ao racismo. Por isso, é com enorme preocupação que convocamos toda a sociedade a se posicionar contra essa decisão racista e arbitrária.

Precisamos nos posicionar urgentemente contra este ataque às políticas de ações afirmativas. Por isso, convocamos, também, toda a sociedade, movimentos negros organizados, coletivos, instituições e todas as pessoas anti-racistas a subscrever este abaixo-assinado. Nao podemos permitir que a branquitude utilize seus privilégios mais uma vez para impedir que pessoas negras tenham seus direitos respeitados, também não podemos nos calar diante o boicote às ações afirmativas.

Assine aqui a petição pública.

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